
De repente, no meio de uma rua deserta do Sans Souci, uma bolinha espinhuda, com jeito de já ter sido um vegetal, despencou lá do céu, bateu no boné e caiu bem minha frente, na calçada. Passado o rápido susto, me abaixei para ver o que seria aquilo.
– Leve-me ao seu líder!
A voz era imperial, autoritária, mas soava muito engraçada, era fininha, parecia aqueles discos de vinil tocados na rotação mais rápida.
– Quem falou?
– Eu, seu idiota, você está quase pisando em mim.
Não havia dúvidas, a voz aceleradinha vinha da, do, sei lá, coisa marrom cheia de pontas.
– Leve-me ao seu líder ou aguente as consequências.
Não é possível, devia ser um sonho ou alguma pegadinha de uma das tvs locais. Olhou para os lados, para cima e nada, tudo continuava deserto como sempre.
– O que quer dizer com consequências?
– Vamos acabar com seu mundo em questão de minutos. Bilhões de seres como eu despencarão em cima de toda a vida do seu planeta e a culpa terá sido toda sua.
Fiquei em dúvida. Para quem eu levaria a bolinha? Para o prefeito? Nem pensar. O governador ou presidente? No caso, como era uma ameaça a Terra, talvez o mais indicado fosse o Secretário Geral da ONU. E como eu ia chegar em minutos em Nova York? Ah, caramba, bem que eu não estava com a menor disposição de sair para andar. A noite estava gelada e, confesso, exagerei no vinho tinto. Agora aguenta, a ressaca vai me acompanhar o dia inteiro.
Ou não!
Dei um chutão na bolinha que subiu e caiu dentro de uma casa vazia, logo a frente. Fechei os olhos e fiquei esperando o apocalipse, a chuva de bolinhas pontudas. Um segundo, dez segundos, um minuto.
– O senhor está passando bem?
Levei outro susto, era o jardineiro da casa amarela, logo atrás de mim. Olhei bem em volta e o mundo prosseguia sua rotina. Agradeci a atenção e resolvi encerrar a caminhada ali mesmo, vai que a história das bolinhas fosse alguma coisa além da imaginação. Voltei, fiz festa na cachorra e mergulhei na minha cama ainda quentinha. Bolinhas falantes, só me faltava essa.